Wednesday, March 19, 2014

Querido Pai,

Mais uma vez, esqueci-me do teu dia. 

Para não variar é neste e no dia do teu aniversário, que mais me esqueço de ti. Não porque faça de propósito, mas porque tanto penso nisso nos outros 363 dias, ou 364 nos anos bissextos, que acabo sempre por me lembrar de ti nos dias a seguir. Nesses dias a seguir lembro-me sempre, e isso já não pode ser assim tão mau para o teu filho.

Há o dia da mulher, da árvore, do fumador, da vitória do nosso clube, da liberdade, dos óscares e até o da queda de cabelo. São tantos os dias em que me lembro de ti que não será por dois dias por ano que vais achar que não te dou importância.

Dou-te importância pela forma como me ensinaste a ver filmes de cowboys, como me contaste a história do início do mundo e do esqueleto zarolho, de como me levaste a ver aquele jogador loiro a marcar golos no estádio de cimento, de como me mandavas ao café comprar maços de SG Gigante, e até de como me colocavas na traseira de uma carrinha de caixa aberta a gritar “25 de Abril sempre, fascismo nunca mais!” 

Faz o que eu faço, não faças o que eu digo. Foi uma frase que nunca me disseste, e que eu também nunca segui. Não vim da terra para a cidade, não fiz o exame da quarta classe, não estive quatro anos em África, não casei com 24 anos nem fui pai aos 25, não emigrei para o estrangeiro para alcatroar as estradas deles, não comprei e vendi andar atrás de andar até ter uma casa só minha, não joguei no totoloto todas as semanas, nem sequer tive um emprego como tu tens desde sempre. Mas acredito no que tu acreditas.

Acredito, como tu, que o trabalho e a honestidade compensam, e apesar de saber que ainda não comprei um Mini, nem fui para a América fazer filmes, continuo a trabalhar naquilo, que tu no início não gostaste, depois começaste a aceitar e que agora acreditas que aparentemente se para mim funciona, é porque vai continuar a funcionar.

Sei que ainda faltam algumas das coisas que sonhaste para mim, mas também sei que o mundo mudou muito e tu soubeste sempre evoluir de maneiras totalmente inesperadas, por isso continua a acreditar que este caminho meu, é também o teu caminho a continuar.

PS: Tens razão, Clint Eastwood diz-se Clinte Astróude.

Obrigado por me teres feito,
e até dia 20 de Março de 2015
Pedro Saavedra (artista português filho de um pai português)

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